Chumbo do OE2022. E agora?
- 4 minutes read - 745 wordsA proposta de Orçamento de Estado apresentada pelo governo acabou por ser chumbada, apenas com os votos favoráveis do PS.
Este resultado representa uma rutura com 6 anos de orçamentos do PS aprovados com o apoio do PCP e BE, ainda que o BE tenha também votado contra há um ano. Os políticos e comentadores do regime — aos quais se veio a juntar também o PAN —, vieram imediatamente proclamar a “irresponsabilidade” do BE e PCP em quebrar um acordo que, supostamente, deu estabilidade ao país. Na realidade, irresponsável foi o BE e PCP terem sustentado, durante 6 anos, um governo burguês que nada fez para a classe trabalhadora; que sempre se recusou a repor os direitos que a Troika retirou; que passava por cima do direito à greve — como no caso dos estivadores, transportadores das matérias perigosas, enfermeiros, professores, etc. Irresponsável foi BE e PCP deixarem a oposição anti-sistema ser encabeçada por um demagogo de extrema-direita que apenas representa a face mais violenta e podre deste sistema. Na realidade, o voto contra do BE e PCP foi a posição mais responsável destes últimos 6 anos. Mas acaba por se tornar difícil de entender pelos trabalhadores, que passaram todo esse tempo a criar ilusões na geringonça.
Mas, infelizmente, a mudança de PCP e BE não se deu principalmente com base nestas preocupações com a lei laboral ou com o crescimento da extrema-direita; se esse fosse o critério, já teriam rompido com o governo há mais tempo. Na realidade, deu-se porque o PCP finalmente percebeu aquilo que o BE tinha percebido um ano antes: que não é possível ficar colado a um governo que atropela os direitos dos trabalhadores sem que isso signifique uma erosão da sua base eleitoral. Assim, as eleições autárquicas tornaram-se a última gota que fez o PCP alterar o seu sentido de voto. Com a sua matemática eleitoral, BE e PCP concluíram que mais valia sofrer uma derrota eleitoral já nestas eleições antecipadas, que vir a correr o risco de desaparecerem, como aconteceu com a Refundação Comunista na Itália.
O PS, por seu lado, está a colocar as suas fichas numa maioria absoluta, para poder governar sem qualquer tipo de negociação com organizações da classe trabalhadora. Aproveitarão o relativo prestígio do governo e o sucesso da vacinação, posando-se como preparados para melhor gerir o dinheiro do Plano de Recuperação e Resiliência.
Do outro lado, a direita continua em crise. Os seus principais partidos históricos, PSD e CDS, vivem um período de luta interna. A direção do CDS está a ser contestada entre Chicão e o representante da ala ainda mais reacionária do partido, Nuno Melo. Mas nenhum dos candidatos consegue travar o processo de implosão que o CDS parece estar a atravessar, com figuras-chave do partido a anunciarem a sua saída.
No PSD, Rui Rio é visto como oportunista e extremista, cujo prometido “banho de ética” nada mais é que um mergulho no esgoto com a companhia de Ventura. Em oposição a Rio, Paulo Rangel aparece como mais centrista, recusando acordos ou apoios do Chega para um eventual governo de direita. Como sabemos, esta posição aparentemente “antifascista” de Rangel é apenas reflexo do oportunismo político a que a direita nos já habituou. O PSD é um partido de governação da democracia burguesa; a gestão do Estado é vital para a sua própria existência. Com essa pressão existencial – e com a votação que os sondagens dão ao Chega – torna-se impossível o PSD não procurar o apoio da extrema-direita para um eventual governo.
Agora, conforme deliberou Marcelo, haverá novas eleições para decidir a composição do parlamento. Catarina Martins já suspira por “uma maioria que responda pelas pessoas”, numa tentativa de ainda dialogar com o PS. Mas que pessoas? Porque nem o PS, nem nenhuma maioria neste país, alguma vez respondeu às pessoas trabalhadoras. O BE e PCP devem procurar acordos, mas não com aqueles que mais vezes votam com a direita, como eles próprios afirmam. O crescimento da extrema-direita é um dado adquirido nas próximas eleições em janeiro; o cenário político dos Açores não está descartado. Para combater esse cenário, é crucial uma alternativa à direita e ao PS. Mas que alternativa quer a esquerda apresentar aos trabalhadores? Mais do mesmo? Disponibilizando-se a serem apenas forças de pressão? Para a RUA, essa alternativa deve servir para a mobilização, ocupando o espaço público, contra o fascismo e pela construção de uma alternativa ao Capitalismo. Porque o povo unido jamais será vencido.